sexta-feira, abril 16, 2010

Pra variar


Pra variar a cabeça a mil por hora (pàra que eu quero descer), muita coisa acontecendo ao mesmo tempo. Ou então sou eu que vez ou outra não dou conta e surto. Curto-circuito.

No estágio as coisas mudam o tempo todo, uma área de trabalho recente cuja legislação está praticamente em fase de construção. A lei do inburgering é de 2007, sem falar que as leis de imigração mudam regularmente (pra pior claro, fiquem avisados).

A última novidade que (quase) me derrubou é que passei praticamente os últimos 7 meses ajudando os professores na aula (uma espécie de assistente de sala de aula) pra agora sair uma nova lei declarando que apenas professores de língua holandesa para estrangeiros CERTIFICADOS (com as devidas qualificações) poderão continuar em sala de aula. O alvoroço é grande no trabalho, não apenas para estagiárias mais dedicadas como eu, como também os colegas que dão aula. A maioria têm anos de experiência dando aula de holandês mas nenhum certificado oficial...e agora está correndo atrás pra legalizar a situação.

Para mim especificamente, isso significa que tudo que eu fiz nos últimos 7 meses não serviu pra nada - ou pra pouca coisa! Claro que esta afirmação é um tanto exagerada porque no fundo até eu sei que a experiência valeu. Abri novas portas, conheci pessoas diferentes e tive oportunidades de aprender algo novo. E o mais importante, descobri - meio que por acaso - a área em que pretendo trabalhar nos próximos anos (se Deus e as leis humanas permitirem).

Me refiro à área de assistência social, mais especificamente voltada pra educação e orientação de imigrantes. Gosto muito de trabalhar com este povo estrangeiro, por razões óbvias me identifico com algumas de suas trajetórias (leia-se: eu também passei por isso). E não me surpreendo mais ao perceber que os valores e costumes brasileiros estão muito mais próximos dos valores dos marroquinos e turcos do que dos holandeses! A começar pela importância da família. Nessas culturas de imigrante, a família é onde tudo começa e termina. São culturas tradicionais e, em sua maior parte, matriarcais.

Aqui na Holanda é bem diferente. Como em quase toda a Europa, com exceção de Espanha, Portugal e Itália, a família não é um dos valores mais cultivados. Os holandeses valorizam a liberdade de expressão, as ambições pessoais, carreiras profissionais e diplomas. Verdade nua e crua que o imigrante mais cedo ou mais tarde aprende. Aqui vive-se em uma sociedade voltada para o desempenho. Nas escolas, universidades e ambientes de trabalho. Uma sociedade patriarcal, acima de tudo. Tudo é traduzido em produtividade, fatos e números. Sim, vivemos em um sistema capitalista mas não precisa exagerar...

Difícil mesmo é o imigrante conseguir se enquadrar neste rígido sistema, sem falar no fato de serem discriminados na escola e no mercado de trabalho. Sim, porque a discriminação racial aqui é algo assustador, têm dias que olho à minha volta e penso que moro na África do Sul, bairros brancos e bairros negros, escolas brancas e escolas negras, etc. Assunto pra outro post, então vou ficar devendo...porque sim, eu evito falar dessas coisas.

Quanto a mim, a luta continua. Tenho ainda mais dois meses de estágio pela frente e quero fazer o melhor possível para aproveitar este período. Vou continuar dando o melhor de mim mesma, como fiz nestes 7 meses. Porque eu gosto do que faço (ainda estou aprendendo mas já gosto muito) e minha relação com alunas e colegas é excelente. O resto a gente vê como fica depois.



PS. Cá entre nós, cabeça cheia é pouco.

2 comentários:

Márcia de Albuquerque Alves disse...

Oi Beth,

Parabéns pelo trabalho tão dedicado dos 7 meses, e pela iniciativa, que mesmo diante dessa erupção de coisas novas, ainda dar o melhor que você pode.

Existe uma historinha que diz assim "certo dia um carpinteiro estava prestes a se aposentar, seu patrão disse-lhe: faça essa última casa, linda, perfeita, coloque amor nela e será seu último, ao terminá-la pode seguir e descansar. O carpinteiro cansado de tanto tempo de trabalho disse: ahhhh vou fazer te todo jeito, terminar logo prá me aposentar. Correu, fez de todo jeito mesmo e ao terminar, seu patrão chegou e disse: espero que tenha feito como lhe pedi, linda e perfeita, que tenha colocado amor, porque essa casa é meu presente prá você."

Moral da história: a gente tem que sempre dá o melhor, porque de repente o que a gente tá fazendo de "todo jeito" é nosso presente e a gente nem percebeu.

bjs Beth!

tania disse...

Achei linda a estória que a Albuq contou. De fato, se paramos para pensar, tudo o que fazemos é antes de mais nada para nós mesmos. É mais um pedacinho da nossa estória, antes de mais nada, mais uma experiência que vai fazendo da gente o que a gente é, já que sempre somos "obra aberta", como disse Umberto Eco de outra coisa.
E Beth, cada dia te admiro mais. Esse modo como você tem encarado os solavancos da vida. Estou sempre por aqui aprendendo contigo. Beijo, siga firme.

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Pra variar


Pra variar a cabeça a mil por hora (pàra que eu quero descer), muita coisa acontecendo ao mesmo tempo. Ou então sou eu que vez ou outra não dou conta e surto. Curto-circuito.

No estágio as coisas mudam o tempo todo, uma área de trabalho recente cuja legislação está praticamente em fase de construção. A lei do inburgering é de 2007, sem falar que as leis de imigração mudam regularmente (pra pior claro, fiquem avisados).

A última novidade que (quase) me derrubou é que passei praticamente os últimos 7 meses ajudando os professores na aula (uma espécie de assistente de sala de aula) pra agora sair uma nova lei declarando que apenas professores de língua holandesa para estrangeiros CERTIFICADOS (com as devidas qualificações) poderão continuar em sala de aula. O alvoroço é grande no trabalho, não apenas para estagiárias mais dedicadas como eu, como também os colegas que dão aula. A maioria têm anos de experiência dando aula de holandês mas nenhum certificado oficial...e agora está correndo atrás pra legalizar a situação.

Para mim especificamente, isso significa que tudo que eu fiz nos últimos 7 meses não serviu pra nada - ou pra pouca coisa! Claro que esta afirmação é um tanto exagerada porque no fundo até eu sei que a experiência valeu. Abri novas portas, conheci pessoas diferentes e tive oportunidades de aprender algo novo. E o mais importante, descobri - meio que por acaso - a área em que pretendo trabalhar nos próximos anos (se Deus e as leis humanas permitirem).

Me refiro à área de assistência social, mais especificamente voltada pra educação e orientação de imigrantes. Gosto muito de trabalhar com este povo estrangeiro, por razões óbvias me identifico com algumas de suas trajetórias (leia-se: eu também passei por isso). E não me surpreendo mais ao perceber que os valores e costumes brasileiros estão muito mais próximos dos valores dos marroquinos e turcos do que dos holandeses! A começar pela importância da família. Nessas culturas de imigrante, a família é onde tudo começa e termina. São culturas tradicionais e, em sua maior parte, matriarcais.

Aqui na Holanda é bem diferente. Como em quase toda a Europa, com exceção de Espanha, Portugal e Itália, a família não é um dos valores mais cultivados. Os holandeses valorizam a liberdade de expressão, as ambições pessoais, carreiras profissionais e diplomas. Verdade nua e crua que o imigrante mais cedo ou mais tarde aprende. Aqui vive-se em uma sociedade voltada para o desempenho. Nas escolas, universidades e ambientes de trabalho. Uma sociedade patriarcal, acima de tudo. Tudo é traduzido em produtividade, fatos e números. Sim, vivemos em um sistema capitalista mas não precisa exagerar...

Difícil mesmo é o imigrante conseguir se enquadrar neste rígido sistema, sem falar no fato de serem discriminados na escola e no mercado de trabalho. Sim, porque a discriminação racial aqui é algo assustador, têm dias que olho à minha volta e penso que moro na África do Sul, bairros brancos e bairros negros, escolas brancas e escolas negras, etc. Assunto pra outro post, então vou ficar devendo...porque sim, eu evito falar dessas coisas.

Quanto a mim, a luta continua. Tenho ainda mais dois meses de estágio pela frente e quero fazer o melhor possível para aproveitar este período. Vou continuar dando o melhor de mim mesma, como fiz nestes 7 meses. Porque eu gosto do que faço (ainda estou aprendendo mas já gosto muito) e minha relação com alunas e colegas é excelente. O resto a gente vê como fica depois.



PS. Cá entre nós, cabeça cheia é pouco.

2 comentários:

Márcia de Albuquerque Alves disse...

Oi Beth,

Parabéns pelo trabalho tão dedicado dos 7 meses, e pela iniciativa, que mesmo diante dessa erupção de coisas novas, ainda dar o melhor que você pode.

Existe uma historinha que diz assim "certo dia um carpinteiro estava prestes a se aposentar, seu patrão disse-lhe: faça essa última casa, linda, perfeita, coloque amor nela e será seu último, ao terminá-la pode seguir e descansar. O carpinteiro cansado de tanto tempo de trabalho disse: ahhhh vou fazer te todo jeito, terminar logo prá me aposentar. Correu, fez de todo jeito mesmo e ao terminar, seu patrão chegou e disse: espero que tenha feito como lhe pedi, linda e perfeita, que tenha colocado amor, porque essa casa é meu presente prá você."

Moral da história: a gente tem que sempre dá o melhor, porque de repente o que a gente tá fazendo de "todo jeito" é nosso presente e a gente nem percebeu.

bjs Beth!

tania disse...

Achei linda a estória que a Albuq contou. De fato, se paramos para pensar, tudo o que fazemos é antes de mais nada para nós mesmos. É mais um pedacinho da nossa estória, antes de mais nada, mais uma experiência que vai fazendo da gente o que a gente é, já que sempre somos "obra aberta", como disse Umberto Eco de outra coisa.
E Beth, cada dia te admiro mais. Esse modo como você tem encarado os solavancos da vida. Estou sempre por aqui aprendendo contigo. Beijo, siga firme.